Não me lembro muito bem da terra onde nasci, nem se a voltarei a ver, ou pelo menos se alguma vez a verei como noutros tempos a vi. Sei que nela havia uma valeta por onde espreitavam prisioneiros eternos que olhavam pelas frestas da clarabóia. Lembro-me de alguns deles, amarelos, enjoados do cheiro nauseabundo que dali emanava. Um deles impressionava especialmente pelo ar alucinado com que olhava para uma parede de vidro que os separava do resto do esgoto em que se encontravam. Olhava a parede como que a justaposição de ratos e animais ali ensanguentados e esborrachados se preparassem para os atacar. O que de facto, poderia não estar muito longe da verdade, não fosse aquela parede de vidro transparente. Através dessa parede viam-se mais quatro, todas elas de vidro e transparentes. Sei disso porque podiam-se ver as juntas onde estas se prendiam ao tecto. No final daquelas paredes surgia finalmente a temível parede de tijolo. Nesta encontrava-se pendurado um antigo cartaz publicitário em que se podia ler “Sentir Macau”. Mas, tendo em conta que a pele é o órgão táctil por excelência, como é que se sente o que nunca se tocou? Haverá quem se sinta compelido a obedecer às ordens da publicidade, que o seu instinto primário seja o de fazer o que lhe mandam, à primeira, obedeço? Sim obedeço! Assim mesmo, sem vírgula entre sim e obedecer. Mas, prisioneiros que estes são obedecer seria corresponder ao instinto e automáticamente agir. Daí que muitos deles morressem ao embater nas paredes que os circundavam, sendo frequente encontrar restos humanos na cela que rapidamente desapareciam sendo esta a sua única fonte de alimento.
Mas agora que já não moro ali tenho um exército de homens treinados para matar. Ao meu sinal muitas destas coisas que vos descrevo desaparecerão e por entre os seus escombros surgirá um novo super-herói de cuecas fuorescentes amarelas e meias de Lycra verde que com o seu grito supersónico dirá “Amor” e atiçará deste modo milhares de pitbulls raivosos que acabarão com todos os fundamentos desta chamada “sociedade”. Nesse dia começará uma nova era em que o animal é finalmente dono e senhor do Mundo, tal e qual como o previsto por Deus. Então, aí, mataremos não por prazer mas por necessidade. Os mais impressionáveis, provavelmente, terão de fechar os olhos enquanto os seus membros são separados do resto do corpo, os mais pequenos poderão ter necessidade de se refugiarem dentro de suas mães e as mais férteis correrão o risco de serem obrigadas a procriar para sobreviver.
É verdade, eu já tenho um exército de homens treinados. E você? Já tem o seu?
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