segunda-feira, 25 de maio de 2009

Inês é roubada.

O namorado de Inês gosta de a beijar. O namorado de Inês gosta de beijar qualquer uma. Qualquer uma gostaria de beijar o namorado de Inês. Inês não sabe nada disto. Inês encontrou-se com o seu namorado. Gostam de se beijar debaixo dos vãos das escadas, bem escondidos dos pais dela que são uns pais à moda antiga, trabalhadores que não gostam nem compreendem demonstrações públicas de afecto. À noite, pobre coitada, ela põe-se a imaginar tragédias nos sons ocos que a cama dos vizinhos de cima faz a bater na parede. O pânico assola-a. Nunca ela tinha ouvido gemidos tão terríveis. Os mortos levantaram-se dos seus túmulos e arrastam agora as suas correntes, pensa. Lembra-se de acordar a baterem à porta, cheios de pressa para entrar. Homens de fraque disparam para todos os lados. Morrem os pais e Inês estende-se no chão, violentada. Era quarta-feira e, como hoje, faltam poucas horas para a entrega do irs via internet. A entrega em mão tinha acabado há já alguns dias. O sufoco agoniava-a. Se fosse ao hospital nunca conseguiria submeter o impresso a horas. Era preciso pedir por socorro mas não o faria agora, pedir por piedade: PIEDADE MEUS SENHORES! e não conseguira piedade. O seu coração nunca aguentou tanta comoção, as finanças nunca a perdoariam, não me posso esquecer de comer comida sã - pensou antes de vomitar. O meu namorado está por pouco na cadeia e a Segurança Social diz que tenho de alimentar todos os pobres deste Mundo pela minha própria mão NHAC adorei esta dentadinha na mão de Inês que também sou pobre. A rapariga responsável por todos os males do Mundo divagava agora com os olhos revirados para cima, a iris desaparecida deixava ver um branco leitoso a escorrer-lhe pela cara. Conseguiria ela somar todos os recibos verdes obrigatórios para toda a população JÁ, putas incluidas, nestas condições? É esta Inês que poderia já namorar nos espaços verdes que crescem nas nossas cidades cheias de hormonas dos compadrios gordos alimentados por tubos directos às veias que metem os músculos a funcionar, que encontramos a morrer no chão. Serão estas as situações que obrigam a facilitar modelos importados de outros estados que, não tendo obrigatoriamente filosofias próximas dos locais onde vivemos, e que deveriam cair por terra, com um grande estrondo, a fazer feridos, mossas e tudo o necessário para a Liberdade do faremos tudo o que quisermos com o nosso corpo e nunca ninguém terá uma palavra a dizer sobre nós seus hipócritas de merda? Será isto melhor do que a pobre Inês teclar os seus rendimentos antecedidos por infinitas passwords que expiram e temos de inventar uma nova e, depois, ela não está escrita de maneira igual nos sítios onde tal tem de acontecer? E a rapariga está em pânico. O sangue escorre sobre o seu computador, a ajuda nunca virá. O namorado está offline.

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